Editorial Destaque

Piso salarial dos profissionais da Enfermagem é aprovado na Câmara dos Deputados

Por 449 a 12, piso será de R$ 4.750 para enfermeiros e pisos proporcionais de 70% do valor para os técnicos e 50% auxiliares e parteiras

Foi aprovado na Câmara dos Deputados por 449 votos a favor e 12 contrários o Projeto de Lei 2564/2020, que estabelece o piso de R$ 4.750 para enfermeiros e pisos proporcionais de 70% do valor para os técnicos e 50% auxiliares e parteiras, corrigidos pelo INPC (Índice de Preços ao Consumidor). De autoria do senador Fabiano Contarato (PT-ES), a categoria foi presença marcante nas galerias e espaços da Câmara, pressionando os parlamentares para, após mais de 30 anos, conquistarem o tão sonhado piso salarial. Numa rara demonstração de unanimidade dentro da Câmara, oposição e situação se uniram para consagrar a Enfermagem brasileira.
Como o projeto não sofreu nenhuma emenda ou mudança na Câmara dos Deputados, segue agora para sanção presidencial. No entanto, o presidente da Câmara, Arthur Lira, informou que só ira enviar para sanção, após ter a dotação orçamentária para suprir os reajustes.

O presidente Jair Bolsonaro pode sancionar ou vetar a proposta e tem o prazo regimental de 15 dias úteis para isso. Caso aprove, vira lei. Caso vete, volta para análise do Congresso Nacional, que pode derrubar ou manter o veto.

Discursos

No início da sessão um requerimento do partido Novo tentou retirar a matéria de pauta, mas foi derrotado pelos votos dos demais deputados. O Novo foi o único partido a orientar voto contrário ao projeto.

Um dos discursos mais emocionantes do dia foi do autor da matéria, senador Fabiano Contarato, que ao subir à tribuna foi aplaudido de pé pelos profissionais da Enfermagem, que gritaram em coro diversas vezes “obrigado, Contarato!”. Ele não foi econômico no apoio ao PL e chegou a pedir perdão pela demora do piso, em nome dos políticos. “Só quem não tem empatia é contra esse projeto. Ele alcança a população mais pobre do Brasil. Esse reconhecimento é o mínimo que podemos fazer, pois irá atender os profissionais e reduzir a desigualdade em nosso país”, disse.

O texto teve apoio do do presidente da Casa, Arthur Lira, que teve discurso lido pela deputada Carmem Zanotto (Cidadania) na sessão de homenagem à Enfermagem. No texto, disse que a categoria mostrou ser a “engrenagem” dos sistemas de saúde e conclamou o apoio dos demais deputados da casa. “Contamos com o apoio dos deputados. Prestamos homenagens aos enfermeiros e estamos unidos em defesa da categoria e de nosso país. Reconhecemos esse nobre trabalho, que é de muita coragem e toca vidas todos os dias”, disse.

A relatora Carmem Zanotto, única enfermeira parlamentar federal, não economizou elogios aos profissionais de Enfermagem, tampouco a luta da categoria, que vibrou nas galerias da Casa. Ela disse que o trabalho em conseguir dotações orçamentárias para viabilizar o projeto continuará.
“Estamos fazendo justiça a uma categoria que luta 24horas pela vida. Parabéns a todos!”

Representantes da Enfermagem falaram na tribuna: Líbia Dantas Bellusci, da direção nacional do Sindicato dos Enfermeiros do Estado do Rio de Janeiro (SindEnfRJ), representou a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS). “Precisamos garantir a vitória da maior classe trabalhadora do Brasil. Estamos zelando 24 horas pelas vidas de todos e chegou a hora desse plenário reconhecer a real importância que a Enfermagem tem para esse país. E, para isso, é necessário valorização através do piso salarial digno.”

Valdirlei Castagna, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), endossou: “Até hoje, das vezes que vim nesta casa falar sobre a Enfermagem, não tivemos nada a comemorar. Estamos há 70 anos buscando reconhecimento, uma luta histórica dos trabalhadores da saúde. Mas hoje é um dia memorável! Pela primeira vez estamos fazendo uma sessão solene fora da Semana da Enfermagem e teremos a oportunidade de corrigir, em parte, essa desvalorização.”

A presidente da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), Shirley Morales, cantou o nordeste brasileiro, as mulheres, as negras, as pardas e os descendentes dos povos indígenas, conclamando a categoria e agradecendo a presença de tantas trabalhadoras no plenário. “Muitos de nós morremos no chão dos hospitais. Foram vidas ceifadas por falta de condições e políticas públicas e se não fosse a Enfermagem no campo de luta – que era campo de guerra – seriam ainda mais vidas”.

A presidente da Associação Brasileira de Enfermagem, (Aben), Sonia Acioli de Oliveira, enfatizou a luta da categoria. “Lutamos por uma Enfermagem digna, decente e, sobretudo, ética”.

A presidente do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), Betânia Santos, finalizou os discursos dos convidados enfatizando que a aprovação do piso será uma conquista, um marco para mais de 2,5 milhões de profissionais de saúde. “Durante os últimos meses, nós peregrinamos de gabinete em gabinete, conversamos com parlamentares e milhares de profissionais fizeram sua parte nas redes sociais, buscando o convencimento das pessoas. Nós conquistamos a opinião pública, de modo que a classe política não teve outra saída, a não ser aprovar a matéria. Humildemente, nós vencemos a polarização e superamos essa ruptura que tanto tem feito o nosso povo sofrer. Na história política recente, poucas vezes temos visto essa união partidária em torno de um projeto. A Enfermagem se orgulha desse exemplo.”

Impacto financeiro

Segundo o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), o impacto financeiro do piso nacional da Enfermagem representa somente 4% do investimento do SUS e apenas 5% do faturamento dos planos de saúde no Brasil. Não obstante, a Enfermagem responde por mais de 50% da força de trabalho da saúde. Esse foi um dos argumentos utilizados para conseguir a aprovação.

O deputado Túlio Gadelha (Rede) chegou a garantir que, no caso de um possível veto presidencial ao projeto, os deputados o enfrentariam e o derrubariam. O deputado Célio Studart (PSD) voltou a questionar o motivo de apontarem o financiamento como um obstáculo ao piso da categoria.

Emoção

O movimento da Enfermagem em prol do PL 2564/20 foi emocionante. Centenas de pessoas se reuniram no estacionamento do Anexo 2 da Câmara dos Deputados, em Brasília, para mostrar seu apoio ao projeto e à causa. Caravanas de todos os cantos do Brasil se reuniram com faixas, cartazes, bonés, camisas com símbolos e frases da luta da categoria por um salário justo e digno. Teve banda, batuque, palavras de ordem, piquenique, gente em pé, gente sentada no chão, cantoria e muita força de vontade e água para suportar o calor e quase 30ºC na capital do país. Pode-se ver bandeiras do nordeste, sul, sudeste, centro-oeste e norte do Brasil.

A esperança no olhar de todos que ali estavam é grande. Muitos jamais pisaram em Brasília. Outros já vieram em outras mobilizações, mas uma coisa une todos os manifestantes: a luta pela aprovação do piso salarial da Enfermagem.

A técnica de Enfermagem, Vaneide Lucena, que veio do Rio Grande do Norte com uma caravana de 50 pessoas, era uma delas. Foram três dias de viagem até Brasília, parando na estrada, tomando banho em locais precários e dormindo pouco para chegar na frente da Câmara dos Deputados e gritar pela aprovação do piso da Enfermagem. “O que nos move é a dignidade, o salário justo, o serviço com amor e o que fazemos”, disse. As companheiras de caravana, Ivoneide Medeiros e Maria José Gomes, ambas técnicas de Enfermagem, concordaram e disseram que “qualquer sacrifício vale a pena pela categoria.”

Da Bahia, a cidade de Irerê esteve presente e os profissionais percorreu mais de 1000km para chegar ao DF. São 25 pessoas que se juntaram para representar a Enfermagem numa caravana cheia de animação. A técnica de Enfermagem Dina Paula disse que para conseguir vir até aqui o trabalho começou muito antes. Elas fizeram rifas, venderam camisas, buscaram patrocínio para conseguir arrecadar o valor suficiente para passar o dia da votação em Brasília e voltar no mesmo dia. “Foi difícil, mas conseguimos. Agora queremos essa votação e conseguir o piso que tanto precisamos.”

 

Por Michelle Araujo
Jornal da Enfermagem

Outras matérias relevantes